Com o impacto da internet que virtualizou o planeta e a preferência do público pelas informações da rede, os jornais impressos estão com os dias contados. Ao menos é o que dizem os especialistas, alertando que alguns jornais já encerraram suas atividades e migraram para as plataformas digitais.
O declínio da imprensa escrita acelerou ainda mais com a pandemia do novo coronavírus, quando a audiência digital dos jornais disparou, mas as vendas de exemplares em papel registraram queda expressiva ou foram suspensas em alguns casos. É que a crise de saúde dificulta o transporte dos jornais aos pontos de venda e a possibilidade dos clientes de obter os exemplares.
Com isso, foram desaparecendo também as bancas do jornaleiro da esquina e os gazeteiros de rua, aqueles que gritava “Extra! Extra!” , repetindo a manchete da capa. Em Manaus, com pilhas de jornais encalhados, muitos jornaleiros desceram as portas de aço sanfonadas de sua banca e foram para casa, dando como fato consumado o fim de um ciclo.
Mas são todos os jornaleiros que pensam assim? Não, uma senhora de 68 anos, permanece sentadinha em seu quiosque, encravado no Mercado Municipal Walter Rayol, vendendo diariamente os jornais de Manaus. E ela faz isso há exatos 39 anos.
— É uma vida, mas eu nem penso em me aposentar. Não sei se viveria longe dessa vida, de saber, através dos jornais, como vai o mundo logo de manhã cedo, da convivência com os amigos, do dia a dia agitado –, diz a jornaleira que, com o tempo, passou a ser uma das mais queridas personagens do velho mercado que, atualmente, passa por uma reforma.
Maria do Carmo Azedo ficou viúva muito cedo e depois de prantear a partida de seu companheiro resolveu fazer alguma coisa para criar as três filhas órfãs de pai: Rosângela, Rosana e Rosemar. Na dificuldade de encontrar um emprego em plena crise econômica porque passava a Zona Franca de Manaus (pra variar), Do Carmo encarou o desafio de vender jornais, alugando para isso um cantinho na esquina do mercado que dá para a Avenida Castelo Branco.
— Naquela época, era costume as pessoas fazerem o mercado e passar na banca para comprar jornal, que era lido durante o café da manhã – , lembra Maria do Carmo que, no auge dos jornais impressos, chegou a vender 4.000 exemplares aos domingos. Naquela época circulavam em Manaus A Crítica, a Notícia, Diário do Amazonas, Em Tempo, O Povo e o Jornal do Comércio. Era muito jornal para a população de 1,7 milhão da época.
Pois foi acordando todos os dias às 04h30 da madrugada, faça chuva ou faça sol, para ir vender jornal que dona Maria do Carmo segurou a barra, sustentou a casa e educou as filhas, todas formadas em curso superior. Hoje, Rosângela Azedo de Oliveira é jornalista, formada em Comunicação Social pela Ufam; Rosana Azedo de Oliveira é administradora pela Fucapi e Rosimar Oliveira Correa, Assistente Social formada pela Faculdade Dom Bosco.
Com os jornais em crise – às vezes ela não consegue vender 30 exemplares por dia – , Maria do Carmo poderia muito bem se aposentar, mas não quer. Primeiro porque tentou isso uma vez e morreu de saudades do burburinho da feira, da algazarra e espírito de companheirismo dos velhos companheiros feirantes. Depois, ela tem plena confianças de que, assim com a pandemia, a crise vivida pelos jornais impressos também vai passar.
— Ainda tem gente que toma o café da manhã abrindo lentamente as páginas de um jornal, passando a vista nas manchetes, discutir as novidades do futebol, ver qual filme está passando nos cinemas, ler o horóscopo, saber o que o pessoal da “alta” sociedade está fazendo lendo as colunas sociais e sujar os dedos de tinta. Isso é gostoso, não tem preço e nunca vai desaparecer –, diz a veterana jornaleira.