Uma nova determinação da Polícia Civil do Amazonas (PC-AM) está gerando forte repercussão entre jornalistas, entidades da imprensa e especialistas em segurança pública. A portaria nº 010/2025, assinada pelo delegado-geral Bruno Fraga, estabelece que delegados e outros policiais civis só podem se comunicar com a imprensa mediante autorização da chefia da instituição.
Segundo o texto publicado em 23 de junho, o objetivo oficial seria evitar o vazamento de informações sigilosas e alinhar a comunicação institucional. No entanto, entidades jornalísticas enxergam na medida uma ameaça direta à liberdade de imprensa e ao sigilo das fontes, garantidos pela Constituição.
A norma centraliza toda e qualquer informação de interesse público na Delegacia Geral, em Manaus, o que, na prática, restringe o acesso direto de jornalistas às autoridades policiais que conduzem investigações relevantes.
“O artigo 5º é muito claro nas garantias individuais quando trata da liberdade de pensamento e de expressão. Os delegados e policiais do Amazonas também são cidadãos com esses direitos. Parece que o delegado-geral desconhece esse princípio”, afirmou Octavio Costa, presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), em nota de repúdio à medida.
Censura institucional?
Pela nova regra, se um jornalista procurar um delegado para entrevista ou informações, o policial é obrigado a comunicar a assessoria da PC-AM e o delegado-geral, que decidirá se autoriza ou não o contato. O descumprimento pode acarretar processos administrativos, civis e até criminais contra o agente.
Para o professor e pesquisador Rafael Alcadipani, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o controle é excessivo e cria um filtro político-institucional sobre o que pode ser divulgado:
“O problema não é evitar vazamentos, mas controlar a narrativa. O que for positivo será permitido; o que for crítico será silenciado. Isso é censura disfarçada de zelo institucional”, alertou.
Liberdade em risco
A presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Katia Brembatti, também criticou duramente a portaria. Segundo ela, a medida representa uma ameaça ao sigilo das fontes, pilar essencial do jornalismo investigativo.
“Se um delegado precisa avisar sua chefia que foi procurado por um jornalista, já se quebra o sigilo da fonte. Essa exigência prejudica o trabalho da imprensa e expõe quem colabora com denúncias ou informações de interesse público”, declarou.
Governo silencia
Procurados pela imprensa, tanto o delegado-geral Bruno Fraga quanto o governador Wilson Lima, preferiram não conceder declarações. A Polícia Civil emitiu apenas uma nota oficial alegando que a medida não compromete o direito constitucional ao sigilo da fonte e visa apenas organizar a comunicação da corporação.
Apesar da justificativa formal, a repercussão negativa da portaria cresceu nas últimas horas, especialmente após a divulgação de trechos do artigo 1º, que exige autorização prévia para qualquer fala à imprensa, mesmo que parta de iniciativa voluntária do policial.
Clima de tensão
A decisão da PC-AM ocorre em um momento em que o trabalho jornalístico tem sido fundamental para o acompanhamento de investigações sensíveis e denúncias de irregularidades em diversas esferas do poder público no Amazonas.
Diante do cenário, cresce a pressão para que a portaria seja revogada ou revista, sob risco de se tornar um precedente perigoso para a transparência pública e o exercício do jornalismo livre no estado.
“A imprensa não pode depender da autorização do governo para cumprir seu papel. A informação pública pertence à sociedade”, concluiu Octavio Costa.