Esse texto é necessário à defesa do jornalismo profissional e da liberdade de informação jornalística. A Constituição Federal, em seu Artigo 220 diz que “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição.” E complementa: “§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.”
No nosso propósito de fazer jornalismo profissional, o site AMAZONAS ATUAL publicou, em julho de 2022, uma reportagem sobre um caso muito parecido com o que levou ao afastamento de um desembargador e de dois juízes, há duas semana no Amazonas. Esse fato gerou uma ação por danos morais e uma condenação em primeira instância ao site.
Tomamos a decisão de não citar o nome do juiz e nem divulgar os nomes dos magistrados que atuaram no processo até aqui, por motivos óbvios.
A notícia veiculada no site AMAZONAS ATUAL em 2022 versa sobre uma representação do Procurador Geral de Justiça do Amazonas, pedindo a abertura de inquérito para investigar um juiz que liberou o pagamento de uma indenização milionária, no valor de R$ 25 milhões, a ex-funcionários do Banco BEA, comprado pelo Banco Bradesco.
Lembremos que o desembargador e os juízes afastados no mês passado pelo Corregedor Nacional de Justiça atuaram em um processo contra a Eletrobrás, e estão sendo investigados por conta da liberação de pagamento de R$ 130 milhões a uma pessoa, dinheiro que foi rateado imediatamente entre dez indivíduos.
A investigação do caso noticiado pelo ATUAL foi determinada por uma ministra do Superior Tribunal de Justiça, que alegou ter sua decisão desrespeitada pelo juiz. Ela havia determinado o não pagamento da indenização, e o juiz mandou pagar, em decisão tomada entre 23h e meia noite.
O AMAZONAS ATUAL tomou ciência da representação do Ministério Público no site do Tribunal de Justiça do Amazonas, quando o processo ainda estava aberto para consulta. O juiz alegou que o site violou o segredo de Justiça, porque todo processo contra magistrado no Tribunal de Justiça do Amazonas deve tramitar sob segredo.
O ATUAL não violou o segredo de Justiça e pediu uma perícia para comprovar em que momento o processo foi carimbado como sigiloso. O pedido foi negado por um dos juízes do caso.
EM BUSCA DA JUSTIÇA E PELA LIBERDADE DE INFORMAÇÃO pic.twitter.com/QKW0VmqFxg
— AM ATUAL (@AmazonasAtual) March 6, 2025
O juiz que ajuizou a ação contra o site alegou que a matéria jornalística externou sua vida íntima, que ele teve seu íntimo abalado após ver detalhes da vida privada indevidamente expostos na matéria.
A matéria publicada não invade a vida íntima do juiz. Narra apenas os fatos referentes aos atos praticados por ele no exercício de um cargo público. Narra um fato concreto, ou seja, uma ação ajuizada pelo Ministério Público, que pediu a apuração do caso e a quebra do sigilo fiscal e bancário do magistrado.
O conteúdo da reportagem apenas narra o fato de o Ministério Público ajuizar a ação e seus porquês. A maior parte das informações que compõem o texto jornalístico foi retirada de decisões do Superior Tribunal de Justiça, que estavam e estão abertas até hoje para qualquer pessoa consultar.
Outro ponto importante: o juiz que julgou o caso diz, com todas as letras, que a condenação ao pagamento de indenização por danos morais serve como medida pedagógica e tem caráter dissuasório para que não volte a repetir o ato. Ora, não se trata de medida pedagógica, mas de medida intimidatória, para desencorajar a publicação de conteúdo desse tipo. Traduzindo para uma linguagem coloquial, o que o juiz sugere é que se proíba o site de fazer jornalismo.
A violação do segredo de justiça é crime, sim, mas é necessário que se prove quem violou tal segredo. Não fomos nós no caso concreto. Por isso pedimos a perícia no sistema, o que seria uma forma de comprovar o que sustentamos, mas houve a negativa de parte do juiz.
Juristas em todo o Brasil sustentam que havendo interesse jornalístico, verossimilhança dos fatos e sendo legal o meio de obtenção das informações, mesmo que protegidas pelo sigilo, o meio de comunicação não comete crime por publicar. Ciente desses fatos foi que publicamos a reportagem, inclusive depois de ouvir o juiz alvo da investigação.
O jornalista ou o veículo de comunicação têm o dever de tornar público assuntos de interesse público, mesmo que essa publicação desagrade autoridades.
O que fizeram os magistrados que até aqui julgaram o caso é violação do Estado Democrático de Direito. Primeiro, um juiz plantonista determinou a retirada da matéria jornalística do ar. O AMAZONAS ATUAL recorreu, e o desembargador que julgou o recurso repetiu o argumento usado pelo juiz plantonista de que o site violou o segredo de justiça e desonrou o magistrado por divulgar que ele está sendo investigado.
Depois, o primeiro juiz que julgou o pedido de indenização, negou um pedido da defesa do ATUAL para que fosse realizado perícia a fim de comprovar que não houve da parte do site violação do segredo de Justiça.
Por último, o juiz que determinou o pagamento de indenização, alegou que a matéria jornalística não tem a intenção exclusiva de informar sobre a existência de prévias investigações, mas de emitir juízo de valor. Afirma o juiz que o jornalista, neste caso, até poderia emitir juízo de valor, mas com “maior cautela e responsabilidade.”
Não há na matéria jornalística produzida e divulgada pelo site qualquer juízo de valor a respeito do caso, mas tão somente os fatos narrados. É falsa a afirmação contida na decisão.
O juiz julgador também afirma que o AMAZONAS ATUAL faz um “juízo midiático de culpabilidade, com a condenação vexatória e pública do magistrado”. Não é verdade. Basta ler a matéria, que, por hora, está indisponível no site a mando de um juiz e de um desembargador. Qualquer pessoa percebe que há rigorosamente a concentração nos fatos. Uma narrativa pura e simples para que o leitor entenda o que levou ao pedido de investigação pelo ministério público.
Em outro trecho, o juiz afirma que a matéria jornalística do ATUAL “acusa o juiz de crimes, sem qualquer embasamento ou indícios fáticos capa capazes de traduzir a matéria como de cunho informativo, tão somente representando opiniões pessoais do requerido a respeito do autor.”
Também não é verdade. O texto jornalístico não acusa o magistrado de qualquer crime. Cita apenas a representação do Ministério Público, o pedido de abertura de inquérito e os porquês que levaram a esse pedido, com informações contidas em decisões do Superior Tribunal de Justiça. Nenhum juízo de valor, nenhuma acusação foi feita.

As ilações contidas na decisão condenatória é são absurdas, retiradas não da reportagem publicada, mas fruto de um delírio, como se a pessoa que escreveu a sentença não tivesse lido o conteúdo da matéria.
Aliás, o juiz acusa o veículo de comunicação de não dar a oportunidade de o juiz se defender, de não publicar direito de resposta ou nota oficial em sua defesa. “Por fim, é de extrema importância citar que não verifico nem ao menos ter sido oportunizado direito de resposta ou prévia oportunidade de emitir nota acerca das informações ao autor, o que fragiliza ainda mais o caráter informacional e imparcial da reportagem e sua presunção de veracidade”, diz trecho da decisão. Também não é verdade.
A reportagem do AMAZONAS ATUAL ouviu o juiz sobre os fatos. Ele diz, e está publicado na matéria contestada, que preferia não se manifestar naquele momento, mas que estava absolutamente tranquilo e com a convicção de que agiu dentro da legalidade. Não pediu direito de resposta. Não emitiu nota de contestação. Apenas buscou o Judiciário.
O AMAZONAS ATUAL não violou o Artigo 5° da Constituição Federal. Não ofendeu a hora do magistrado, porque tratou de um assunto de interesse público que diz respeito ao cargo público por ele ocupado. Não violou o segredo de justiça, porque teve acesso ao processo antes de ele ser carimbado como sigiloso.
Trata-se de um caso clássico de assédio judicial em que o autor da ação e os julgadores são membros do judiciário. O resultado, neste caso concreto, é o cerceamento da defesa e a condenação pelo espírito de corpo, contrariando a própria Constituição da República.
Por isso, vamos buscar o direito à liberdade de expressão e de informação. Vamos recorrer da decisão à instância cabível no Tribunal de Justiça do Amazonas. Confiamos que a Justiça seja restabelecida no âmbito estadual. Se não for possível, vamos recorrer ao Superior Tribunal de Justiça. Estamos dispostos a ir até o Supremo Tribunal Federal, que tem a última palavra sobre assuntos constitucionais.
Também iremos acionar o Conselho Nacional de Justiça para que restabeleça o direito, a lei e a Constituição Federal, que garante a plena liberdade de informação jornalística e o direito a um processo justo, sem cerceamento do direito de defesa, com julgamento baseado nos fatos e nas provas.
E vamos continuar fazendo jornalismo profissional sem medo de intimidações.