Quem desembarca em Manaus, principal porta de entrada da Amazônia, é recebido pelo Aeroporto Internacional Eduardo Gomes. Poucos passageiros sabem, porém, que o militar que dá nome ao terminal teve uma trajetória marcada por golpes de Estado e sucessivas tentativas de subversão da ordem democrática no Brasil.
A história voltou ao debate após uma reportagem do Fantástico, da TV Globo, revelar em detalhes o papel central de Gomes em quatro rupturas institucionais ao longo do século 20.
O militar da Aeronáutica, Eduardo Gomes, participou de ao menos quatro momentos da história em que militares tentaram influenciar nas decisões do Brasil. São elas:
✈️ 1922: Revolta dos 18 do Forte
Em 5 de julho de 1922, jovens oficiais do Exército se rebelaram contra o governo civil de Epitácio Pessoa.
Eduardo Gomes, então tenente da Aeronáutica, foi um dos protagonistas da chamada Revolta dos 18 do Forte, movimento tenentista que tentou derrubar o presidente. A insurreição foi duramente reprimida, mas abriu caminho para novas articulações.
✈️ 1930: Queda de Washington Luís
O fracasso de 1922 não desanimou Gomes. O militar voltou à cena em 1930, quando a crise do café abalou a economia e serviu de combustível para outro levante.
Desta vez, ele participou da conspiração que depôs o presidente Washington Luís, abrindo caminho para Getúlio Vargas assumir o poder fora das urnas.
✈️ 1954: Pressão sobre Getúlio
Décadas depois, já general, Gomes assinou um manifesto de generais que pedia a renúncia de Getúlio Vargas.
A pressão política e militar foi tamanha que Getúlio, em gesto dramático, tirou a própria vida no Palácio do Catete.
✈️ 1964: Golpe militar
Em 1964, Eduardo Gomes já era marechal e novamente se alinhou ao golpe que depôs o presidente João Goulart, eleito democraticamente. Nunca foi punido por nenhuma dessas ações — pelo contrário, acumulou promoções e prestígio.
🚨 Golpista de carteirinha!✈️
— Mário Adolfo Filho (@marioadolfo) September 15, 2025
O Fantástico mostrou que o militar da Aeronáutica, Eduardo Gomes, foi golpista em 1922, 1930, 1954 e 1964.
Por que o aeroporto de Manaus tem o nome de quem fez da conspiração seu ofício? Hora de rever! pic.twitter.com/4vX3aoUAN4
Silêncio e homenagem oficial
Apesar dessa sequência de atentados contra a democracia, o nome de Eduardo Gomes foi escolhido para batizar o principal aeroporto do Amazonas.
O decreto que oficializou a homenagem é da década de 1970, período em que o regime militar — que ele próprio ajudou a instaurar — controlava as decisões sobre infraestrutura e memória oficial.
"O aeroporto de Manaus foi inaugurado em 1976 e, na época, o presidente do Brasil era Ernesto Geisel, militar extremista, não colocaria nome de civil. Mas, seria relevante um pedido popular para mudança", sugeriu o Frank Souza, pelas redes sociais.
Historiadores ouvidos pelo Fantástico e por nossa reportagem são unânimes: a trajetória do brigadeiro se insere em uma tradição de impunidade e anistia que naturalizou golpes de Estado no Brasil.
“Não havia constrangimento em deixar um rastro de conspirações. Golpear o Estado de Direito nunca custou caro no país”, assinala a análise do professor de Direito da FGV-SP, Oscar Vilhena.
Pergunta que ecoa no saguão
A revelação do Fantástico reacendeu a discussão: faz sentido que a principal porta de entrada da Amazônia leve o nome de um homem que passou a vida atentando contra a democracia?