Numa maratona de eventos que ocorreram nesta quinta-feira (11), em Manaus, a jornalista, escritora e ex-candidata à vice-presidência da República Manuela D'Ávila (PCdoB) discutiu o potencial destruidor das fake news. Segundo a política gaúcha, um dos desafios dos grupos de esquerda é mostrar que a indústria da desinformação é nociva por pregar o ódio, reforça comportamentos negativos como a intolerância e impede o desenvolvimento de uma sociedade justa e igualitária, principalmente nas disputas por cargos no parlamento e no Poder Executivo.
A ativista, vítima de inúmeras fake news ao longo da vida pública, destacou que o processo de desconstrução da imagem por adversários vem se intensificando, principalmente depois da utilização em massa das redes sociais. Relembrou que ao se eleger pela primeira vez como vereadora de Porto Alegre, aos 22 anos, em 2004, as mentiras demoravam para reverberar e que, agora, além de afetarem a honra, colocam a família em risco permanente. Este foi o motivo que a fez se afastar do processo eleitoral de 2022.
“Não é fácil saber que sua filha está sendo ameaçada de morte, ameaçada de estupro porque você decidiu se candidatar a um cargo político. E o pior é saber que ninguém, nenhuma autoridade vai tentar resolver esse problema, tentar descobrir quem fez isso”, disse Manuela. Ela lamentou a falta de apoio. “Naquela hora, a acolhida à minha decisão foi perto do zero”.
Para Manuela, o Projeto de Lei das Fake News (PL 2630), que dispõe sobre a regulação das plataformas digitais, deve ser aprovado em caráter de urgência. “A lei é pra proteger a sociedade brasileira. Uma pessoa que dissemina fake news espalha o terror, prega atos antidemocráticos pode ser punida. Mas o meio utilizado (plataforma) está ileso. Isso não pode acontecer. As plataformas são responsáveis porque distribuem, seletivamente, o que ganha repercussão. Quem lucra com as ameaças deve ser punido. Temos de combater a desinformação com educação, com cultura, com difusão do conhecimento”, declarou Manuela D’ÁVila.
O posicionamento da política gaúcha foi endossado por Tanara Lauschner (professora da Universidade Federal do Amazonas, pesquisadora da área de computação, co-fundadora do Cunhantã Digital e consultora do Programa Meninas Digitais).
“As plataformas não seguem regras. Eles são julgados por nos intoxicar e sequer recebem a notificação. Hoje, está mantida a imputabilidade da rede. As plataformas não são o carteiro, que não tem conhecimento do conteúdo da carta. Elas sabem bem o que distribuem, não são neutras. Não há artigo no PL 2630 de censura. Não é o PL perfeito, é o possível neste momento”, afirmou Tanara.
Mães na política
Dentre os grupos minorizados dentro do universo político, as mães receberam destaque no encontro ocorrido no Centro Cultural Palácio da Justiça. Manuela D’Ávila, que fez inúmeras adaptações à carreira para poder conceber Laura (7 anos), fez questão de discutir o assunto ao lado de diversas mulheres que enfrentam dificuldades para ter uma vida política atuante por não terem com quem deixar os filhos e por falta de compreensão.
“Não há sororidade entre as mulheres quando a mãe está na política. As pessoas acham que o lugar da mãe não é no ambiente público. Que a mãe deve ser julgada toda hora por deixar seu filho e ir militar. Ou por levar seu filho para a militância. Mas devemos deixar claro que o lugar da mãe é, sim, na política, se ela assim quiser”, afirmou.
Nesta agenda, ela estava acompanhada do ex-deputado federal José Ricardo (PT) e de Anne Moura (PT), que fez campanha disputando o cargo de vice-governadora do Amazonas, grávida. Seu filho, Simon Luiz, nasceu entre o primeiro e o segundo turno do pleito de 2022, e a mãe, mesmo de resguardo, se manteve no pleito por meio das redes sociais.
“Teve um lado bom e um ruim. Uma das coisas boas foi a grande solidariedade das pessoas, que me acolheram. Mas muitas pessoas diziam: tu estás gestante, esquece essa questão política. Mas eu fui para as ruas. A minha agenda era tão intensa quanto do meu companheiro de chapa (Eduardo Braga – MDB)”, relembrou Anne Moura.
Comportamento
Uma das organizadoras do evento, a produtora cultural Michelle Andrews, que no ano passado integrou a Bancada das Manas (candidatura coletiva de cinco mulheres que disputaram uma vaga na Assembleia Legislativa do Amazonas pelo PCdoB), a vinda de Manuela abriu novos horizontes de reflexão. A aproximação com as camadas sociais mais baixas é fundamental assim como uma mudança de comportamento por parte dos eleitos.
“Parece que há uma desconexão total entre a pessoa que disputa uma campanha e a mesma pessoa depois que assume um cargo eletivo. Os eleitos esquecem as propostas e se dedicam a causas pessoais. Por isso, as pessoas estão sem esperança. Elas não acreditam mais no parlamento. Elas não acreditam mais que a gente possa defender nossa cidade, nosso país. Elas não acreditam mais que a gente possa mudar uma realidade por meio de leis. Só iremos contornar isso a longo prazo e com políticos comprometidos com as demandas que os elegeram”, finalizou Michelle Andrews.