A Procuradoria-Geral de Justiça do Ministério Público do Amazonas (MPAM) ouviu, na terça-feira (22/7), a indígena da etnia Kokama que denunciou ter sido vítima de estupros por policiais militares e um guarda municipal durante nove meses na delegacia de Santo Antônio do Içá (a 880 quilômetros de Manaus). Ela ficou esse período em uma cela mista até ser transferida para Manaus.
A escuta ocorreu na Cadeia Pública Feminina de Manaus, onde a vítima está presa desde agosto de 2023. Segundo o MPAM, o objetivo foi garantir acolhimento institucional e reunir elementos para acompanhar as investigações e cobrar a responsabilização dos envolvidos.
“Estamos diante de um caso extremamente grave, que fere os princípios mais elementares da legalidade, da humanidade e da Justiça, e que será acompanhado com toda a atenção necessária. A resposta do MPAM será ser firme, proporcional à violência sofrida pela vítima", afirmou a procuradora-geral de Justiça (PGJ) Leda Mara Albuquerque, que esteve acompanhada de representantes do Núcleo de Apoio às Vítimas e Vulneráveis (Naviv/Recomeçar) e a equipe técnica multiprofissional do órgão.
O MPAM acompanhará as investigações conduzidas pelas corregedorias das Polícias Civil e Militar e do Sistema de Segurança Pública, e atua para garantir que todas as medidas legais sejam adotadas, tanto na esfera criminal quanto cível.

O caso permanece sob sigilo judicial no que diz respeito à responsabilização criminal dos agentes apontados como autores dos abusos. Já na esfera cível, a vítima pleiteia reparação por danos morais e materiais em razão das violações sofridas.

Entenda o caso
A indígena foi presa em 11 de novembro de 2022, após uma vizinha acionar a Polícia Militar por suspeita de violência doméstica pelo então companheiro da mulher. Na delegacia, os policiais identificaram um mandado de prisão em aberto contra ela, por suposta participação em um homicídio em Manaus, em 2018.
De acordo com os relatos da vítima, os abusos teriam ocorrido de forma sistemática, inclusive com episódios de estupros coletivos e na presença de seu filho recém-nascido — que permaneceu com ela durante o período de custódia. A vítima afirma ainda não ter recebido qualquer tipo de assistência médica ou psicológica após o parto.
A mulher só foi transferida para Manaus no dia 27 de agosto de 2023, nove meses após a prisão.
O que diz os outros órgãos
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM) e a Polícia Civil informaram que foi instaurado um procedimento para apurar o caso.
Já a Polícia Militar afirmou que abriu um inquérito policial militar, atualmente em fase final de investigação.
A Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM) informou que tomou conhecimento do caso no dia 28 de agosto de 2023 e que após o relato, solicitou o imediato encaminhamento da vítima à Delegacia da Mulher, onde foi realizado exame de corpo de delito que confirmou conjunção carnal e a presença de sinais de violência.
"À época, a vítima se encontrava extremamente abalada e com receio de que, caso o caso viesse a público, houvesse retaliação por parte dos policiais envolvidos, já que sua mãe e seus filhos ainda residiam no interior do estado. Diante desse contexto de vulnerabilidade, a Defensoria Pública optou por conduzir o caso com a máxima cautela, zelando pela proteção integral da vítima e de seus familiares, ao mesmo tempo em que adotava todas as medidas legais cabíveis para garantir sua segurança e responsabilização dos autores", afirmou o órgão.
A DPE-AM reforçou a gravidade das denúncias e informou que seguirá acompanhando o caso de forma rigorosa.