O poeta amazonense Thiago de Mello morreu aos 95 anos, nesta sexta-feira (14/1), em Manaus. A causa da morte ainda não foi informada.
Nascido em Barreirinha , no interior do Amazonas, Thiago de Mello é um dos poetas mais conhecidos da região e possui influência tanto nacionalmente quanto de forma internacional, com obras traduzidas em mais de trinta idiomas.
Em setembro do ano passado, a 34º Bienal de São Paulo homenageou Thiago de Mello. O verso que inspirou a bienal, “Faz escuro mas eu canto”, é parte do poema Madrugada Camponesa.
Leia o poema mais conhecido de Thiago de Mello, Os Estatutos do Homem, de 1977:
(Ato Institucional Permanente)
Fica decretado que agora vale a verdade.
que agora vale a vida,
trabalharemos todos pela vida verdadeira.
Fica decretado que todos os dias da semana,
inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a converter-se em manhãs de domingo.
Fica decretado que, a partir deste instante,
haverá girassóis em todas as janelas,
que os girassóis terão direito
a abrir-se dentro da sombra;
e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
abertas para o verde onde cresce a esperança.
Fica decretado que o homem
não precisará nunca mais
Que o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento,
como o vento confia no ar,
como o ar confia no campo azul do céu.
O homem confiará no homem
como um menino confia em outro menino.
Fica decretado que os homens
estão livres do jugo da mentira.
Nunca mais será preciso usar
a couraça do silêncio
nem a armadura de palavras.
O homem se sentará à mesa
porque a verdade passará a ser servida
Fica estabelecida, durante dez séculos,
a prática sonhada pelo profeta Isaías,
e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.
Por decreto irrevogável fica estabelecido
o reinado permanente da justiça e da claridade,
e a alegria será uma bandeira generosa
para sempre desfraldada na alma do povo.
Fica decretado que a maior dor
sempre foi e será sempre
não poder dar-se amor a quem se ama
que dá à planta o milagre da flor.
Fica permitido que o pão de cada dia
tenha no homem o sinal de seu suor.
Mas que sobretudo tenha sempre
o quente sabor da ternura.
Fica permitido a qualquer pessoa,
a qualquer hora da vida,
o uso do traje branco.
Fica decretado, por definição,
que o homem é um animal que ama
e que por isso é belo.
muito mais belo que a estrela da manhã.
Decreta-se que nada será obrigado nem proibido.
inclusive brincar com os rinocerontes
e caminhar pelas tardes
com uma imensa begônia na lapela.
Só uma coisa fica proibida:
Fica decretado que o dinheiro
não poderá nunca mais comprar
o sol das manhãs vindouras.
Expulso do grande baú do medo,
o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
para defender o direito de cantar
e a festa do dia que chegou.
Fica proibido o uso da palavra liberdade.
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
e a sua morada será sempre