Garantia essencial ao livre desenvolvimento da personlidade e da própria democracia, a liberdade de expressão está neste ano de 2022 vez em quando sendo objeto ora de ataques, ora de defesas, multiplos são os casos (e a tendência é aumentar haja vista o período eleitoral) em que vemos abertamente situações que nos levam cada vez a indagar, afinal quão livre é essa tal de liberdade de expressão?
O mais recente destes casos deu-se no dia 19 último e tem como pivô uma vez mais a utilização de nosso estandarte nacional em ato supostamente de protesto contra o atual governo brasileiro, como já noticiado, a cantora Bebel Gilberto, patriota brasileira, nascida em Nova York e morando nos Estados Unidos, enquanto se apresentava em show na cidade de Menlo Park na Califórnia, interage com o público, recebe o pavilhão verde e amarelo e após andar pelo palco com nosso símbolo nacional, atira-o ao chão e proferindo palavras de ordem “I don’t like to do that, because I’m not Bolsonaro” sai pisoteando e sambando em cima do lábaro estrelado.
Ato seguinte, diante do espanto a resposta do público pede desculpas, em livre tradução: “Ok, eu acho que vocês ficaram com raiva porque eu fiz aquilo com a bandeira do Brasil, né?”(pega a bandeira, acaricia, beija e pede desculpas )“desculpa, bandeira, desculpa, Brasil”, na sequencia “we want Brazil to be a bananeira” e segue para cantar seu hit “Bananeira” .
Desnecessário nesta altura dos acontecimentos repetir aqui toda repercussão gerada pelo episódio, basta dizer que se intensificaram os ânimos de ambos espectros politicos nacionais ao se ver o aguião nacional ser vilipendiado, supostamente em ato de repúdio.
Desta feita e trazendo uma vez mais contornos históricos-constitucionais da terra mãe de Bebel Gilberto, a Suprema Corte dos EUA no caso de 1989 Texas v Johnson decidiu por maioria apertada de 5 votos contra 4 que ultrajar a bandeira norte-americana faz parte da liberdade de expressão prevista na Primeira Emenda da Constituição, no caso em questão Gregory Lee Johnson participou de um encontro do Partido Republicano na Prefeitura de Dallas em 1984 e ao se insurgir contra as políticas do então Presidente Reagan, retirou uma bandeira Americana, encharcou-a de querosene e ateou fogo.
Consequência disto Johnson foi preso e condenado por violar a Lei do Texas (e naquele momento de outros 47 Estados) que proibia o vilipêndio do vexilo americano, sua apelação chegou a Suprema Corte em 1989 sob o argumento de que seu ato estaria salvaguardado pela Primeira Emenda protetora da liberdade de expressão, Jonhson defedeu a tese de que seu ato não foi dirigido a destriuição de um símbolo nacional, mas sim movido por seu sentimento de repúdio ao governo Reagan, sendo portanto um ato politico e como tal não poderia ser tolido.
No voto vencedor Justice Brenan escreveu: “se há um princípio fundamental subjacente à primeira emenda, é que o governo não pode proibir a expressão de uma ideia simplesmente porque a sociedade considera a ideia em si ofensiva ou desagradável.
Noutros termos, para Corte Suprema preservar o direito fundamental à liberdade de expressão, por mais repugnante que essa expressão possa ser, era mais importante do que preservar a bandeira como símbolo de nacionalidade.
Entre nós já de há muito o galhardete nacional não está elencado em qualquer legislação que proíba sua destruição ou vilipêndio, apesar de opiniões contrárias, a própria Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/83), deixou de colocar como contravenção o ultraje à bandeira. No momento encontra-se pendente no Congresso Nacional o PL 3.113/2020 que visa apenar quem “destruir ou ultrajar os símbolos nacionais quando expostos em lugar público, tramitando na Câmara sem data para conclusão.
Eis então o dilema: como pensar em nossos símbolos nacionais sendo utilizados para as mais diversas manifestações, políticas ou não, e os limites da liberdade de expressão?
Particularmente, como tantos brasileiros, este articulista aprendeu desde berço e posteriormente nas famosas aulas de Educação, Moral e Cívica (e já dito aqui em outro artigo) que “símbolos nacionais (…) não são considerados objetos de cunho partidário, ideológico ou governamental”, denvendo a eles ser dirigidos respeito e preservação, afinal em um país como o nosso atualmente tão dividido, poucos são os elementos, os símbolos que nos unem, devendo a eles ser dirigida a proteção e guarda devidos.
Não posso negar que fiquei consternado com a maneira com a qual nosso maior símbolo nacional foi tratado no episódio em questão, como em tantos outros que vemos em reuniões as mais disitintas com as mais distintas finalidades, por vezes abusando do direito de livre manifestação de pensamento, a despeito disso rendo-me a máxima de que a defesa da liberdade de expressão deve ser feita com mais liberdade, nunca com censura ou qualquer espécie de tolimento.
Nas palavras do Professor Daniel Sarmento: “a consagração constitucional da liberdade de expressão parte da premissa antipaternalista de que as pessoas são capazes de julgar por si mesmas o que é bom ou ruim, correto ou incorreto, e têm o direito moral de fazê-lo. Por isso, não é legítimo às autoridades públicas proibirem a manifestação de uma ideia por considerá-la errada ou perniciosa. Até porque, se o Estado pudesse decidir o que pode e que não pode ser exprimido, haveria a tendência natural de que tentasse silenciar as ideias contrárias aos governantes, ou aquelas que desagradassem às maiorias que lhe dão suporte politico.”
Em nota última somente para efeito de reflexão, entendendo que somos todos iguais em deveres e direitos, não existindo qualquer diferença entre nós brasileiros, naturais ou adotivos, fico a indagar até quando aqueles que dizem amar nosso País mas vivem por opção no exterior, longe do calor de nossas lutas e debates, serão os protagonistas dos embates que todos nós temos a responsabilidade de ter? Claro que sua voz deve ser ouvida, mas e a nossa? Onde estamos? Como diz um antigo professor, é somente para pensar mesmo. É isso.
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