Eles compartilham com os profissionais da saúde uma missão em comum: proteger vidas. A batalha contra um inimigo invisível é um novo desafio para os profissionais da Segurança Pública, que arriscam a vida diariamente para garantir o cumprimento das medidas restritivas.
O secretário de Segurança Pública do Amazonas, coronel Louismar Bonates, traz uma nova perspectiva sobre o dia a dia da polícia no Amazonas durante a pandemia de Covid-19.
O “novo fardamento” passou a incluir, além das algemas, armas, balaclavas e coletes, as máscaras e o álcool em gel. Tudo isso sem deixar de combater o crime organizado. Em 2020, houve queda em todos os principais indicadores de criminalidade e apreensão recorde de drogas no Amazonas.
Confira a entrevista com o secretário de Segurança Pública.
AGÊNCIA AMAZONAS: Secretário, muitas pessoas insistem em desrespeitar as medidas de restrição. Recentemente, um vídeo seu viralizou. O senhor flagrou uma festa clandestina e desarticulou uma atividade ilegal. Aquele momento foi um desabafo também dos militares que estão nas ruas, se expondo à contaminação, enquanto muitos não colaboram?
CORONEL BONATES: Sim. Aquele foi um momento de desabafo, de ver pessoas irresponsáveis, sem ter o devido cuidado com a comunidade como um todo. Nós estamos vivendo uma situação atípica em todo o mundo. O mundo todo está sem saber como atuar com isso, é uma doença nova, é um negócio diferente, e nós precisamos que as pessoas tenham consciência social. O que nós vimos ali foi um ato de rebeldia, de irresponsabilidade daquelas pessoas, colocando em risco a vida de todos.
Nós precisamos que os nossos hospitais estejam desocupados de tiros, de facadas, de bebedeiras, para que as pessoas que estejam acometidas do Covid-19 possam ter o devido tratamento. O que nós vimos ali realmente me revoltou bastante. A maneira até jocosa como eles estavam se achando no direito de infringir a lei, fazendo com que muitas atitudes que estão sendo tomadas pelo governo tenham que ser prorrogadas por causa daquelas irresponsabilidades.
AA: Um importante instrumento que ficou mais conhecido nesse período de pandemia foi a CIF, que é a Central Integrada de Fiscalização. Que balanço o senhor faz até aqui? De alguma forma, isso evitou uma proliferação maior ainda do vírus?
CB: Sim. Essa Central Integrada de Fiscalização funciona há bastante tempo, mesmo antes da Covid-19. Ela visa eliminar irresponsabilidades e atos infracionais que estejam acontecendo, principalmente no comércio. Agora, no período da Covid-19, ela foi intensificada. Trabalham membros do Estado e da Prefeitura de Manaus. Está sendo um trabalho importantíssimo. A atuação deles é mais incisiva em termos de punição do que o trabalho que nós fazemos como um todo, e tem sido fundamental a atuação dessa equipe.
AA: Como têm sido as abordagens de pessoas que estão desrespeitando os decretos? Trata-se de um desafio ainda maior para a Segurança Pública?
CB: Agora, nesse período, as pessoas estão ou mais conscientes, ou mais cientes de que há punição. Foi criado pela Delegacia Geral um espaço específico só para tomar conta de casos de decreto. Nós estamos fazendo [a fiscalização]. Aquelas pessoas que estão desrespeitando o decreto são encaminhadas para a Delegacia-Geral e respondem a um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO).
AA: A polícia também tem trabalhado na segurança das vacinas e dos locais de vacinação, transportando cilindros, entre outras ações. Como tem sido essa logística?
CB: O trabalho que as polícias estão fazendo está sendo fantástico. Além do policiamento normal, dentro das suas peculiaridades, tanto a Polícia Militar quanto a Polícia Civil estão trabalhando diuturnamente, de uma maneira até heroica, digamos assim.
Além do acompanhamento e fiscalização dos locais de vacinação junto com os órgãos da Prefeitura, o nosso trabalho normal está sendo intensificado em cima de armas, de drogas, de prender pessoas que estão foragidas.
Além desse trabalho, os policiais, tanto civis como militares, estão carregando cilindros, estão levando cilindros para o interior do estado, estão fazendo escolta dos cilindros, porque muitas pessoas irresponsáveis estão tentando roubar esses cilindros para vender no mercado negro.
As polícias estão se desdobrando muito, com toda boa vontade, conscientes da sua missão social também, para dar esse apoio para a população, para que o nosso estado volte à normalidade que precisa.
AA: O senhor destacou que, em paralelo às ações de combate à Covid-19, a SSP tem atuado fortemente no combate à criminalidade. Em 2020, tivemos a maior apreensão de drogas no estado, o que é reflexo de um trabalho das polícias. Mas há também uma grande participação da população através das denúncias?
CB: Sim, tem sido importante essa parceria. Essa confiança que a população voltou a ter na Segurança Pública tem facilitado muito o nosso trabalho, que em consequência dá retorno de segurança para a comunidade.
A comunidade tem nos trazido muita informação. A gente vê que no dia a dia, quando eles veem que fazem a denúncia e nós atuamos, eles passam a denunciar mais ainda.
O caso das drogas é um bem clássico. O crime é denunciado, a Polícia Civil tem apurado, junto com a Polícia Militar, nós temos ido para operações, feito essas apreensões. Isso aí reflete no prejuízo para o crime organizado e mais segurança para a população.
AA: Como denunciar?
CB: São três canais em que você pode fazer as suas denúncias: no 190 quando estiver acontecendo o fato, ali, na hora; no 181 você liga, presta suas informações mais minuciosas. É quando você sabe sobre locais de drogas, locais de prostituição, de corrupção de menores, de feminicídio. A sua identidade é preservada. E também pelo site da Secretaria de Segurança Pública, onde tem aumentado bastante o número de denúncias.
AA: Sobre a sua experiência pessoal. Com tantos anos de atuação na Segurança Pública, o senhor já havia vivenciado algo parecido com a guerra em que estamos agora, contra um inimigo invisível?
CB: Eu tenho mais de 40 anos trabalhando na área de Segurança e nunca tinha vivido uma situação como essa. É um inimigo invisível.
É realmente necessária a união de todos. Essa politização barata que estão tentando fazer nesse momento só traz prejuízo para todos nós. Precisamos que não tragam críticas destrutivas, e sim ideias para somar, braços para lutar ao nosso lado, para que a gente possa superar esse momento – momento que não é nosso, mas mundial.
AA: De tudo que o senhor viu até agora, o sofrimento das pessoas, a força da solidariedade, o que mais vai ficar marcado para o Bonates?
CB: O ser humano ainda tem jeito. A demonstração das pessoas à noite, do trabalho, do policial que está ali morrendo de sono, mas está ali saindo do seu trabalho, e sabe que está tendo um problema de condução de cilindros, ele largar a sua folga e ir lá ajudar, fazer lanches em suas casas para distribuir para a comunidade.
Esse trabalho junto com a comunidade, em que temos visto muitas pessoas indo para as portas de hospitais à noite, indo para as comunidades levar ranchos, a gente vê realmente que esse é o lado que nós precisamos da sociedade, uma sociedade unida, uma sociedade realmente tendo boas ações.
AA: Para finalizar, o senhor foi infectado pelo coronavírus e esteve, e ainda está, na linha de frente. Que mensagem deixa para aquelas pessoas que insistem em desrespeitar as medidas de prevenção?
CB: Se a pessoa quer arriscar a sua vida, é um problema dela. Agora, ela tem que pensar nas outras pessoas, nas pessoas das suas famílias. Quase todas as nossas famílias perderam entes queridos. Poucos dias atrás perdi uma prima. Falei com ela de manhã, de noite ela disse que tinha piorado, e no dia seguinte não consegui mais falar com ela. Ela faleceu na madrugada.
É realmente um risco muito grande que nós estamos correndo. O que a gente quer é que essas pessoas se conscientizem, se conscientizem de que suas famílias e as famílias dos outros dependem da sua consciência social.